8 de Dezembro de 1980. Faz hoje trinta anos. Trinta. John Lennon foi assassinado. Quando disse, anos antes, o seu célebre «The Dream is over», não sabia quão ironicamente enganado estava. O sonho tinha perdurado ainda depois dos Beatles, foram as balas do assassino cujo nome não vou escrever que o mataram. E que nos deram consciência da nossa própria mortalidade. Obrigada, Yoko Ono, o grande amor da vida de John, por continuar a lutar para que a criatura não saia da prisão. Já lhe foram recusados quatro pedidos de liberdade condicional. No dia 8 de Dezembro de 1980 morreu muito mais do que um homem, morreu uma concepção do mundo. Foi o fim definitivo de uma era.
Ele tinha 40 anos acabados de fazer (9 de Outubro). Eu tinha 20, feitos em Agosto. E, claro, tinha uma enorme paixão pelos Beatles. Ele era o meu preferido, pelo sentido de humor sardónico, que não poucas arrelias lhe trouxe. Devido à diferença horária, já só no dia 9 fomos colhidos pela notícia. Tinha combinado almoçar em casa do Vítor, como em tantos outros dias. Ele não tinha aparecido na faculdade, na véspera tinha-me dito para ir lá ter depois das aulas, mesmo que ele não pusesse lá os pés. Estranhei que fosse ele a abrir a porta, estranhei encontrá-lo já à minha espera no patamar, junto do elevador. Abri a porta interior, ele abriu a outra e pôs-me as mãos nos ombros. «Teresa, o John Lennon morreu.»
Devo ter aberto muito os olhos, dividida entre espanto e incompreensão, a tentar assimilar. Não me lembro do que disse, se é que disse alguma coisa. Só me lembro de que chorei. Ali, no patamar, parada ao lado de um elevador com as duas portas escancaradas. Chorei no ombro do Vítor.
A imagem que ilustra este post é a capa da revista Time dessa semana. Uma preciosidade. Que eu tinha. Estupidamente, emprestei-a. Adivinhem o que aconteceu... O título, «When the Music Died» é uma referência (incorrecta) a um verso do refrão de American Pie, de Don McLean: «The day the music died...»
A imagem que ilustra este post é a capa da revista Time dessa semana. Uma preciosidade. Que eu tinha. Estupidamente, emprestei-a. Adivinhem o que aconteceu... O título, «When the Music Died» é uma referência (incorrecta) a um verso do refrão de American Pie, de Don McLean: «The day the music died...»
O texto acima foi escrito há três anos, faz hoje três anos, porque é impossível esbarrar nesta data sem lembrar John (no original lia-se vinte sete anos, e não trinta).
Trouxe-o de volta porque, hoje e sempre, é assim que lembro esse terrível 8 de Dezembro de 1980, tinha eu 20 anos, tinha John 40. Incompreensivelmente assassinado à entrada do edifício em que vivia, o mítico Dakota — e não há ida minha a Nova Iorque que não inclua romagem àquelas bandas, ao edifício (conversa com os porteiros incluída) e a Strawberry Fields, assim ficou a chamar-se aquele cantinho de Central Park qusae fronteiro que é o cantinho de John e de todos nós, os que lá vamos prestar-lhe homenagem. O cantinho em que em calçada portuguesa [e se vierem cá dizer-me que é mosaico bizantino, não obstante o figadal ódio que tenho à (...) da calçada portuguesa e àquilo que me faz aos saltos dos sapatos, levam com um grunhido que nem sonham] foi lavrada a palavra IMAGINE .
Calemos o nome do assassino, que nunca será aqui escrito. Agradeçamos a Yoko (que tantos pretensos fãs dos Beatles odeiam) a sua luta sem tréguas para que o tresloucado continue sem ter liberdade condicional. Eu e o Abel gostamos de Yoko, gostamos muito de Yoko (eu até gostava de fazer-lhe chegar o livro do Abel, mas isso são outros quinhentos), Yoko foi o grande amor de John, tem sido uma incansável paladina dos seus ideais, como é possível não gostar dela?
A música que escolhi para tocar hoje aqui, neste aniversário doloroso, não é uma das maiores músicas de John. Mas é uma das últimas por ele escritas e é eloquente. E é dirigida a Yoko.
Depois de um longo período de reclusão, John tinha voltado a compor. Depois dos primeiros anos da vida de Sean, em que tinha escolhido ser the present parent, com Yoko, sagaz mulher de negócio a gerir (e a multiplicar) o vasto património do casal, John reemergia. Double Fantasy é para mim o último registo desse tempo agora para sempre pretérito das estrias numa rodela de vinil e da agulha que se baixava com muito cuidado, para não riscar. Com todas as falhas e imperfeições que possam apontar-lhe, Double Fantasy é para mim um disco comovente.
John tinha acabado de fazer 40 anos, não esqueçamos. Era novo, novo, muito novo! E é essa estuante vontade de viver, de recomeçar, relevando erros antigos, querendo que só o que de bom houve vença, prevaleça e se sobreponha ao resto, que John canta em (Just Like) Starting Over. Tomemos esta canção pelo que é e alegremo-nos por John, que partiu desta vida num momento muito feliz e de enorme harmonia. A dor, toda a dor, ficou com Yoko. E connosco, claro. Porque não esquecemos.
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